quinta-feira, 18 de abril de 2013

Cidadania indígena: novos rumos à diversidade cultural


Cidadania indígena: novos rumos à diversidade cultural


A cidadania é criação dos estados modernos. Existe como forma de estabelecer determinados direitos destinados às pessoas que residem no território estatal, que devem ser acessados e garantidos de maneira igual e universal, no sentido de abarcar a todos, sem discriminações que provoquem desigualdades no uso e na afirmação dos direitos.
Esta forma de estabelecer a cidadania, que nós podemos chamar de “comum”, foi sendo revista ao longo dos últimos 60 anos de história da humanidade para incluir outra forma de cidadania: a dita “diferenciada”. Esta representa a definição de direitos específicos para determinados segmentos da sociedade, como crianças, idosos, negros e povos indígenas, pensados a partir de suas especificidades identitárias e vulnerabilizações sociais.
Igualdade na diferença
Mas o que significa tratar os indivíduos e povos indígenas como cidadãos diferenciados? Para Gersem dos Santos Luciano, pertencente ao povo Baniwa e doutorando em Antropologia Social pela Universidade de Brasília (UnB), significa dupla condição: garantia do acesso aos bens e serviços da sociedade moderna, correlato ao respeito à autonomia das culturas indígenas em relação a todos os âmbitos da organização social. Quer dizer, da economia à religião, do sistema jurídico ao território e os modos de representar as fases da vida, assim como do acesso a serviços que devem ser estruturados, levando-se em conta suas especificidades culturais.
O que está em jogo é a ideia de ressignificação das práticas e das imagens sociais difundidas historicamente para explorar e oprimir os povos indígenas - como as de ingenuidade, selvageria e incapacidade. É a ideia de igualdade na diferença, de inclusão do respeito à diversidade cultural como elemento definidor de novas relações sociais. Isto está assentado em documentos jurídicos como a Constituição Federal de 1988, a Convenção Nº169 da Organização Internacional do Trabalho de 1989 e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas de 2007.

Cidadania diferenciada
Em primeiro lugar, é preciso entender que esta diversidade cultural está cada vez mais “no vizinho ao lado” do que em alguma aldeia distante de sua casa. De acordo com o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), atualmente a população indígena residente no Brasil se localiza mais no meio urbano do que no meio rural. Além disso, entre 1991 e 2000, o crescimento populacional indígena foi quase sete vezes maior do que do restante dos habitantes da nação, passando de 294.131 pessoas, em 1991, para 734.127 no ano 2000, e chegando em 2010 à marca de 817 mil pessoas.
Em segundo lugar, os indígenas participam cada vez mais de espaços sociais onde antes eram excluídos, como as universidades, os partidos políticos, empresas e a direção de instituições públicas e privadas.
Em terceiro lugar, a garantia às terras indígenas tem crescido nos últimos tempos, conjuntamente com a implementação de políticas públicas para oferta de serviços de saúde, educação, geração de renda e acesso à justiça, estruturadas a partir do diálogo com os parâmetros culturais das coletividades indígenas. Isso não inibe a emergência de novos conflitos, tensões e violações de direitos, mas sinaliza a possibilidade de instrumentalização da cidadania como elo para ligação entre as etnias e forma de reivindicação política pela efetivação de direitos.
Sem dúvida, a cidadania diferenciada, o crescimento populacional e o fortalecimento político-organizacional dos povos indígenas exigem o repensar de nossas condutas para com a diversidade cultural. É preciso educar o olhar para a adequada compreensão das diferenças como possibilidades de diálogo e aprendizagem mútua. Além disso, representam situações onde podemos questionar a relativa normalidade dos valores que assumimos como universais ou comuns.
 
Assis da Costa Oliveiraprofessor da Faculdade de Etnodesenvolvimento da Universidade Federal do Pará, Belém, PA
Artigo publicado no jornal Mundo Jovem - edição 425 - abril 2012- pag 15

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